
E com você … foi diferente ?
Qualquer história é cheia de reticências e interrogações, entre outras: as dúvidas, a falta de informações e o descuido com os registros. Descuido mesmo, porque se confiava (e se confia) muito na memória viva, considerada difusão oral e tradição auricular. Essa é muito volátil, a de pais pra filhos, de amigos para amigos, de vizinhos para vizinhos e geralmente vai para o túmulo sem deixar registros.
Mais ainda quando se trata de família, porque as informações que chegavam às paróquias e aos cartórios eram muitas vezes defasadas, imprecisas e atrasadas, sem a preocupação de ser fiel à realidade dos fatos. A criança nascia lá no “mato” e, quando a mãe dava à luz, essa luz era sempre uma bruxuleante e morteira claridade com a candeia, acompanhada dos primeiros cuidados: o pó de fumo, o azeite e a folhazinha de mamona, para curar o umbigo, e o quarto fechado como precaução, para evitar o “mal de sete dias”. E para a parturiente o resguardo de quarenta dias e a reconfortante sopa de galinha gorda.
Eu sou o Pimenta, José Gomes Pimenta, o Prof. Pimenta. Ou melhor: o Zezé do Sô Miguel. O menino da Dona Maria. Neto do último dos patriarcas daquele nosso meio: o respeitável Sr. Osório Pimenta. Tradicional família ali pelos meados do Retiro, Mangonga e Cajuru Velho, margeando o ribeirão que desce das bandas do Mato Escuro e das Aroeiras e se junta ao córrego que vem do Capão da Cana, para desaguar lá longe, formando um pequeno contributo das águas do Rio Pará.
Comigo a diferença foi pequena. Apenas que, às vésperas de eu nascer, papai saiu do Retiro, levando a mamãe para Carmo do Cajuru, deixando-a aos cuidados da Dona Norvina, recomendada e renomada parteira na época. Foi ela que me “aparou” e me deu o primeiro entre os tantos tapas que a gente vai levando pela vida afora. Ela, a Vó Norvina, pois era comum chamar as parteiras de Vó.
Um rancho na cidade
E foi ali que eu chorei pela primeira vez, na casa que o vovô construiu para a família arranchar quando saía da roça e “ia lá na rua”: missas, primeira sexta-feira, semana santa, “ir no doutor”, comprinhas (basicamente o sal e o querosene da lamparina, esse que já começara a disputar espaço com o azeite das candeias). O resto era por ali mesmo: horta, quintal, roça, capão, campo, serrado, chiqueiro, curral, galinheiro. Até os remédios: casca, raiz, frutos, flores, folhas, sementes.
A casa onde eu nasci. Essa casa, até bem pouco tempo, ficava bem ali, na beira da linha, porta da sala voltada para a porta da (hoje centenária) igreja matriz: era só atravessar a rua, pular a linha da ferrovia, subir os degraus do arrimo de pedra, ar por um pequeno plano e subir a escadaria do adro. A casa foi desistoricamente demolida, dando lugar aos tempos de hoje … ficava entre a casa do Sr. Antônio Miguel e a do Tio Zé Pacífico (Tia Augusta).
Mas … e a história ?
Meu muito prezado e saudoso amigo, o Prof. Oswaldo Diomar é referência quando se quer falar sobre a história e a genealogia em Carmo do Cajuru. E além dele eu guardo na estante as raízes Pimenta, nas obras de Flávio Flora, X Gontijo, Lázaro Barreto, Christovam Teixeira e os irmãos Gontijo de Azevedo. Eles falam sobre a história da vizinha Divinópolis, só que é impossível falar sobre Pimenta em Carmo do Cajuru, sem começar por ali. Isso porque Manuel Fernandes Teixeira é historicamente considerado o fundador de Divinópolis, mas na realidade o proprietário das terras e patriarca da família foi o sogro dele, JOÃO PIMENTA FERREIRA, que inclusive foi quem pôs as mãos no bolso, financiando as atividades do genro.
O Prof. Oswaldo, sem dizer o nome, cita “um dos filhos de João Pimenta Ferreira” e deste filho vem o neto, com os mesmos nome e sobrenome do avô. E é aí que Carmo do Cajuru começa a entrar na história, porque o filho desse segundo João era, já com o sobrenome invertido, José Ferreira Pimenta, que se deslocou para cá, fincando raízes, construindo sua casa e criando sua família na Fazenda do Retiro.
Esse casarão patriarcal ficava nas imediações do Cajuru Velho, de onde a estradinha rural seguia (e ainda segue), ando pelo Quebra Viola, pela casa dos Bento, pelo “Munho” e pela Água Espalhada, a caminho do nascedouro Carmo do Cajuru. Os restos dessa velha fazenda resistiram até bem pouco tempo, indo ao chão e dando hoje espaço para a vida escrever os capítulos de uma outra história.
A voz da Genealogia
O escritor Lázaro Barreto, em seu Memorial de Divinópolis, acha o estudo das descendências tão complexo, que o considera “UM DESAFIO PARA OS GENEÁLOGOS”. Mas embora leigo (totalmente leigo) e apenas um modesto leitor dos citados autores, eu separei agora até aqui os três primeiros vultos desta história: o velho patriarca João Pimenta Ferreira (esposo de Eugênia Vieira da Silva), um dos seus filhos (citado pelo Prof. Oswaldo, sem mencionar o nome), e o seu neto, o novo João Pimenta Ferreira (esposo de Maria Joaquina de São José).
Deixei para esta parte o José Ferreira Pimenta, porque ele já é mais nosso; ele se tornou Cajuru. Já com a invertida, ele veio para cá, e com a sua descendência e a chegada de novos moradores, criou a sua família e deu origem ao Cajuru Velho. E é nesse ponto que eu começo a entrar na história: entre os seus vários filhos, está o meu avó Osório Ferreira Pimenta (casado com Ana Batista de Miranda) e entre os vários filhos do Vovô Osório, está o meu pai Miguel Ferreira Pimenta (casado com Maria Batista Quadros).
E assim estamos nós, os três irmãos: José (Nelcy), Advirgem e Romeu (Cléa). Continuando a saga, vivendo o dia a dia, dando o nosso recado e abrindo espaço para que os nossos filhos Clarice, Clóvis, Valéria, Rodrigo e Fernanda e os nossos netos, o Miguel, o Lucas e a Lara prossigam escrevivendo esta história.
Professor José Gomes Pimenta – Cajuruense